A Marcha dos Pingüins
O cinema possibilita ao homem a oportunidade de refletir sobre si e o mundo que o cerca. Hoje, talvez se sobressaia às demais artes devido à possibilidade de divulgação em massa. Não pretendo desmerecer a literatura, mas acredito que o número pessoas no mundo que sabem o que é MATRIX é bem superior aos que sabem do que se trata o livro O Código da Vinci. O cinema é uma forma barata de entretenimento, educação e cultura, embora parcialmente accessível (infelizmente, boa parte da sociedade ainda não tem acesso). Quem de nós não possui um filme favorito, um que nos marcou ou mudou indiscutivelmente a forma como enxergamos a vida? Eu tenho vários: Magnólia, Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças, Ônibus 174, entre outros. Quais são os seus?
A Marcha dos Pingüins é uma obra impecável que realça a importância da arte cinematográfica para a humanidade. O documentário dirigido por Luc Jacquet acompanha a saga do pingüim imperador no continente antártico e a marcha pela manutenção da vida da sua espécie. Com o fim do verão, milhares de pingüins marcham do mar até uma localidade dentro do continente para procriarem. Eles se acasalam, botam ovos, chocam e alimentam os filhotes. O processo toma nove meses, três estações, entre elas, o rigoroso inverno da região. Um exemplo tocante de esforço, dedicação e sacrifício pela perpetuação da vida.
O que pode parecer um mero exemplar de documentário da National Geographic é na verdade um grande filme dramático, e se não ouso em demasia, cabe como enredo para uma ópera. A esplêndida direção de Luc Jacquet acerta em não apenas observar, mas comentar e explicar as ações dos pingüins. Ele criou uma estória com personagens para esta saga. Só pelas imagens o filme seria sensacional, mas de certa forma faltava uma costura, algo que fizesse até o mais simples e menos instruído espectador compreender a beleza de tudo aquilo (papel que todo bom diretor tem obrigação de fazer – simplicidade é diferente de simplismo). Ele criou a mamãe pingüim, papai pingüim e o filhote.
A sensibilidade do texto em conjunto com as imagens fatalmente leva às lagrimas os mais emotivos. É difícil não se emocionar com a despedida da mãe após botar o ovo e dar ao pai para chocar. Não quero estragar a experiência do filme, mas o porquê da despedida está no texto da mãe.
Como em todo bom drama, há também uma pitada de tragédia. A Natureza (maiúsculo, pois se trata de uma personagem no filme) exerce esse papel coadjuvante com uma força assustadora para nós humanos. É o ovo que não pode ficar em contato com o solo, senão congela; os predadores naturais dos pingüins no mar e dos filhotes; o inverno que sacrifica aqueles que não se preparam adequadamente para o processo. A cena em que um casal de pingüins tenta passar de um para outro o ovo traz uma avassaladora angústia. O esforço e o objetivo de um ano de um casal de pingüins se destrói em poucos segundos de descuido. O ovo foi congelado e não mais se fará a vida. Neste instante, o espectador já se tornou também um pingüim.
Há centenas de cenas que cabiam ser discutidas por essa crítica, mas deixo que elas sejam devidamente avaliadas em uma roda de amigos, cada qual a seu modo. Saliento a da união dos machos durante o inverno, que se agrupam em círculo, um aquecendo o outro, assim, mantendo a temperatura para chocarem os ovos (bem que o brasileiro, melhor, a humanidade poderia realizar algo semelhante).
O esforço pela vida dos pingüins só pode ser comparável ao da equipe de produção que se sujeitou a mesmas situações adversas do continente antártico para nos trazer essa obra de arte. Por mais que escutasse ou lesse sobre esta saga, nada tem mais impacto do que ver as imagens. Ressalto a importância do cinema, ou que seja do audiovisual, incluindo aí a televisão, para proporcionar ao ser humano conhecimento e reflexão. Por mais que a arte cinematográfica tenha se tornado um produto rentável, e assim, o entretenimento fácil se sobrepôs à cultura, ainda há espaço para obras primas como A Marcha dos Pingüins.
Embora o filme emane beleza, um ar de tristeza paira após assisti-lo. Só de pensar que os pingüins imperadores passam nove meses se esforçando para perpetuar a espécie, e nós humanos sacrificamos milhares em guerras ou apenas uma através do aborto, chego a pensar que talvez não sejamos filhos da mesma natureza. Talvez não seja tão vantajoso ter “o telencéfalo altamente desenvolvido e o polegar opositor”, como afirma Jorge Furtado em a Ilha das Flores.
[Não deixe de conferir: a beleza da trilha sonora de Emilie Simon. Apesar das cópias em DVD serem eficientemente dubladas por Antônio Fagundes e Patrícia Pillar, o áudio original em francês possui uma força singular.]
A Marcha dos Pinguins (La Marche de L'Empereur - 2005)
Direção: Luc Jacquet
Elenco: Charles Berling, Romane Bohringer, Jules Sitruk (narradores).
Gilvan Marçal - gilvan@gmail.com
A Marcha dos Pingüins é uma obra impecável que realça a importância da arte cinematográfica para a humanidade. O documentário dirigido por Luc Jacquet acompanha a saga do pingüim imperador no continente antártico e a marcha pela manutenção da vida da sua espécie. Com o fim do verão, milhares de pingüins marcham do mar até uma localidade dentro do continente para procriarem. Eles se acasalam, botam ovos, chocam e alimentam os filhotes. O processo toma nove meses, três estações, entre elas, o rigoroso inverno da região. Um exemplo tocante de esforço, dedicação e sacrifício pela perpetuação da vida.
O que pode parecer um mero exemplar de documentário da National Geographic é na verdade um grande filme dramático, e se não ouso em demasia, cabe como enredo para uma ópera. A esplêndida direção de Luc Jacquet acerta em não apenas observar, mas comentar e explicar as ações dos pingüins. Ele criou uma estória com personagens para esta saga. Só pelas imagens o filme seria sensacional, mas de certa forma faltava uma costura, algo que fizesse até o mais simples e menos instruído espectador compreender a beleza de tudo aquilo (papel que todo bom diretor tem obrigação de fazer – simplicidade é diferente de simplismo). Ele criou a mamãe pingüim, papai pingüim e o filhote.
A sensibilidade do texto em conjunto com as imagens fatalmente leva às lagrimas os mais emotivos. É difícil não se emocionar com a despedida da mãe após botar o ovo e dar ao pai para chocar. Não quero estragar a experiência do filme, mas o porquê da despedida está no texto da mãe.
Como em todo bom drama, há também uma pitada de tragédia. A Natureza (maiúsculo, pois se trata de uma personagem no filme) exerce esse papel coadjuvante com uma força assustadora para nós humanos. É o ovo que não pode ficar em contato com o solo, senão congela; os predadores naturais dos pingüins no mar e dos filhotes; o inverno que sacrifica aqueles que não se preparam adequadamente para o processo. A cena em que um casal de pingüins tenta passar de um para outro o ovo traz uma avassaladora angústia. O esforço e o objetivo de um ano de um casal de pingüins se destrói em poucos segundos de descuido. O ovo foi congelado e não mais se fará a vida. Neste instante, o espectador já se tornou também um pingüim.
Há centenas de cenas que cabiam ser discutidas por essa crítica, mas deixo que elas sejam devidamente avaliadas em uma roda de amigos, cada qual a seu modo. Saliento a da união dos machos durante o inverno, que se agrupam em círculo, um aquecendo o outro, assim, mantendo a temperatura para chocarem os ovos (bem que o brasileiro, melhor, a humanidade poderia realizar algo semelhante).
O esforço pela vida dos pingüins só pode ser comparável ao da equipe de produção que se sujeitou a mesmas situações adversas do continente antártico para nos trazer essa obra de arte. Por mais que escutasse ou lesse sobre esta saga, nada tem mais impacto do que ver as imagens. Ressalto a importância do cinema, ou que seja do audiovisual, incluindo aí a televisão, para proporcionar ao ser humano conhecimento e reflexão. Por mais que a arte cinematográfica tenha se tornado um produto rentável, e assim, o entretenimento fácil se sobrepôs à cultura, ainda há espaço para obras primas como A Marcha dos Pingüins.
Embora o filme emane beleza, um ar de tristeza paira após assisti-lo. Só de pensar que os pingüins imperadores passam nove meses se esforçando para perpetuar a espécie, e nós humanos sacrificamos milhares em guerras ou apenas uma através do aborto, chego a pensar que talvez não sejamos filhos da mesma natureza. Talvez não seja tão vantajoso ter “o telencéfalo altamente desenvolvido e o polegar opositor”, como afirma Jorge Furtado em a Ilha das Flores.
[Não deixe de conferir: a beleza da trilha sonora de Emilie Simon. Apesar das cópias em DVD serem eficientemente dubladas por Antônio Fagundes e Patrícia Pillar, o áudio original em francês possui uma força singular.]
A Marcha dos Pinguins (La Marche de L'Empereur - 2005)
Direção: Luc Jacquet
Elenco: Charles Berling, Romane Bohringer, Jules Sitruk (narradores).
Gilvan Marçal - gilvan@gmail.com
Melancólico e belo. Gostei muito do filme.
ResponderExcluirO filme combina bem documentário e ficção. Saí do cinema querendo adotar um pingüim!
ResponderExcluirWhere did you find it? Interesting read » »
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