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A Experiência

Há filmes que fazem um barulho discreto no cenário cinematográfico e acabam chamando a atenção de cinéfilos mais atentos. Não fosse a internet que ecoa e amplia este barulho, muitos filmes de pequeno orçamento sumiriam sem serem descobertos. Procuro estar atento às novidades que estão rolando no mundo. Sou apaixonado por Billy Wilder, David Fincher e Paul Thomas Anderson, mas estou sempre à procura de novos filmes e novos diretores. Neste ano que passou, tive gratas descobertas como Old Boy, Primer e Casshern. Neste processo de descoberta há um outro viés que é a frustração de não encontrar o filme.
Um desses não encontrados era a produção alemã A Experiência. Apesar de lançado em DVD no Brasil, a dificuldade em encontrá-lo nas locadoras é imensa. Pode-se dizer que em locadoras especializadas ele seja encontrado, mas tenho um cálculo para verificar se o filme é de fácil acessibilidade: vá a 10 ou 20 locadoras e pergunte pelo filme, se a porcentagem de existência for abaixo de 30%, portanto é de difícil acesso. A minha dificuldade e o anseio em assisti-lo só foram compensados com a aquisição do DVD a R$ 14,90, achado por acaso numa de promoção (Adquira o hábito de procurar em promoções de DVD).
Vinte homens participam de uma experiência que investiga o comportamento agressivo em um ambiente de prisão simulada. Oito serão guardas e doze prisioneiros durante duas semanas. Passados os dias, conflitos explodem e a experiência põe em risco a vida de todos, cientistas e cobaias.
Baseado no livro Das Experiment - Black Box, de Mario Giordano, A experiência é um deleite para apreciadores de filmes inquietantes. Não há como ficar impassível diante das situações as quais os vinte homens são experimentados. Com recursos limitados, o diretor Oliver Hirschbiegel constrói um filme angustiante e flerta com um ponto essencial para compreensão da evolução humana: Sem a violência, dificilmente conseguimos nos organizar. A experiência realizada tem um princípio básico no qual os oito guardas não devem usar de violência para conter os prisioneiros. A intenção dos cientistas é estudar o comportamento e a forma de organização usada pelos guardas. Mesmo com o êxito dos guardas na contenção da primeira rebelião sem usar de violência física, o uso de humilhação com os prisioneiros acende o estopim da violência.
Segundo Nicolau Maquiavel, em O Principie, o povo obedece e respeita um rei, ou por amor ou por temor. Tal afirmação de Maquiavel é relevante para compreender o conceito de respeito “forçado” entre prisioneiros e guardas. A história da humanidade está ligada à máxima: O forte que está em cima, detentor do poder da violência, guia e obtém o respeito do fraco que está embaixo. Qualquer alusão às grandes potências com elevado poder bélico é mera coincidência. A obtenção de respeito entre prisioneiros e guardas dá-se apenas através do uso da violência, seja física ou psíquica.
As humilhações sofridas pelos personagens geram no espectador uma identificação quase nauseante. Se alguém me humilhasse assim, eu iria revidar. Os mais puristas podem até negar, mas não há nada melhor do que um bom revide, ir à desforra. A devolução das humilhações é o último passo antes da agressão física. Quem já viu uma briga sabe. Primeiros os insultos, depois a luta. O maior mérito do filme está na abrangência e no potencial reflexivo que o tema sugere.
Estreando na direção, Oliver Hirschbiegel, como um bom alemão, realizou seu trabalho de forma eficaz e sem virtuosismo. Atém-se a narrar com eficiência a história e usar os elementos necessário para que ela funcione. Ele é responsável pelo estupendo A Queda - As últimas Horas de Hitler, segundo filme da carreira. O cuidado e o primor em construir enquadramentos e a direção de atores são seus elementos diferencias. Um detalhe singular de A Experiência é o uso de gravações em vídeo. Circuito interno de segurança, entrevistas com os participantes e a câmera escondida nos óculos de Tarek(Nº 77). Esse hibridismo de película e vídeo é interessante e aponta a convergência quase inevitável entre televisão e cinema. Hirschbiegel começou na TV e usa de forma apropriada as cenas em vídeo, relacionando-as ao conceito do filme. As perdas em qualidade de imagem podem se tornar ganho se o vídeo for bem utilizado.
Mas há problemas, principalmente no roteiro. O relacionamento relâmpago de Tarek(Nº 77) com Dora, que surge em pequenos flashbacks, simplesmente não funciona. Fiquei me perguntando: o que esse menina está fazendo nesse filme? O ritmo frenético do presídio é quebrado freqüentemente com os flashbacks. Ao final, o relacionamento não é tão relevante assim para o encadeamento da trama. Soa como uma porta de fácil saída e não uma solução. Seria mais interessante descobrir o motivo da saída de Tarek(Nº 77) do jornalismo, e se isso teria a ver com o comportamento intempestivo dele. Só não merece cinco estrelas por isso. Outro ponto incômodo foi a pouca intervenção dos cientistas nos acontecimentos, que culmina na literal participação deles dentro da experiência. A falta de controle dos cientistas frente ao experimento é pouco verossímil, mas abre leque a uma discussão: os cientistas têm total controle sobre seus experimentos?
A Experiência é um filme obrigatório por ser dirigido por Oliver Hirschbiegel, diretor alemão que desponta como grande promessa. Talvez esteja surgindo mais um nome importante desta Alemanha de homens geniais e também geniosos.

A Experiência (2001)
Direção: Oliver Hirschbiegel
Elenco: Moritz Bleibtreu, Christian Berkel, Oliver Stokowski.

Gilvan Marçal - gilvan@gmail.com

2 comentários:

  1. Ola

    Achei muito interessante a critica. principalmente pela abordagem de avrios temas relativos ao filme.

    Mas acho que faltou comentar um pouco mais o filme. Voce se ateve muito a aspectos exteriores.

    Ah, ea cho q a flata de intervenção dos cientistas foi intecional, e no momento crucial, eles não conseguiram intervir a tempo, nãoa chei q isso foi um ponto negativo do filme

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  2. Cinematograficamente o filme é comum, só salientei questão do hibridismo. O diretor alemão não é virtuoso. O mais importante do filme são os afluentes de discussões que ele propicia. Tentei falar mais disso. O ideal é mesclar os dois, mas nem sempre consigo. As vezes o texto vai numa linha e fica bom, Tento até encaixar algo aqui ou ali para dar mais corpo, mas no fim acaba virando um Frankstein.
    Vi como um ponto fraco a pouca intervenção dos cientistas, mas depois até questionei a mim mesmo se isso não seria proposital pelo filme. Acho que é salutar discordarmos, pois o que desejo é saber o que você acha do filme. Esse blog é processo dialético. Mando daqui, vc manda daí e vamos crescendo juntos.

    Abraço e continue comentando.

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