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PRIMER


Vencedor do Festival de Sundance em 2004, Primer tornou-se cult antes mesmo de ser apreciado pelo grande público. A história da realização do longa já vale a atenção para este filme. Realizado com apenas sete mil dólares, uma ninharia perto dos milhões gastos pela indústria cinematográfica, Primer esnoba pela qualidade e a relação custo x benefício. O cineasta Shane Carruth além de escrever, dirigir, editar, compor a trilha e produzir, também atuou como protagonista dessa trama intricada e complicada de ficção cientifica, que tem um dos quebra cabeças mais complicados que já conferi na telona.

A idéia brilhante de Carruth reside em realizar quase todo o filme numa garagem, justamente, a da casa dele. Com poucas cenas externas, Primer se concentra em velozes diálogos e intrincadas explicações matemáticas. Aeron (Shane Carruth) e Abe (David Sullivan) são dois engenheiros que, nos horários de folga, se dedicam a construção de uma máquina. Não se sabe bem a função real da engenhoca, e mesmo os personagens vão se assustando com o que o projeto acaba se tornando. A ausência de informação, que dá um nó na cabeça do espectador, atiça mais e mais a curiosidade.

O roteiro vai explorando diversas discussões sobre a máquina e seu funcionamento. Testes são feitos pelos personagens e os espectadores vão acompanhando, como se fossem mais um engenheiro membro da equipe. Claro que, os debates são complexos e o longa pode soar cansativo para alguns espectadores desavisados.  Há uma clara sensação de incomodo e desconforto, pelo fato de se compreender pouco onde essa maluquice matemática irá levar. Primer é ficção científica densa e bem feita, o que não necessariamente tenha que ser fácil. Tente lembrar do impacto ao assistir Amnésia, do hoje consagrado diretor de Christopher Nolan. É bem nessa linha, mas um pouco carregado no tempero.

O espectador vai juntando as peças, separando e analisando a hora certa de encaixá-las. A máquina consegue gerar uma proteína a partir de um determinado fungo. Só que a quantidade produzida em cinco horas, a ciência atual só conseguiria produzi-la em cinco anos. Isso significa o que? Significa que o roteirista chutou seu quebra-cabeça. Tudo aquilo que você estava montando, infelizmente, estava errado. Essa irritante provocação, apesar de deixar a história mais confusa, parece desafiar quem está assistindo: Quer entender essa sandice, continue acompanhando. Nesse ponto, muitos vão abandonar o barco, digo, o filme. Aqueles que aceitam e continuam o desafio, deparam-se com a fatídica cena do binóculo. A cara de Aeron após olhar no binóculo é idêntica a de todo espectador. “What fuck!! Me explica o que aquilo ali?”.

O maior pecado de Primer, talvez, seja o excesso de complexidade. Só lá pela segunda vez que se assiste se percebe alguns pontos relevantes na história. Portanto, ratifica-se a referência à Amnésia. O roteiro é bom e traz todas a explicações, contudo, é uma tarefa árdua processar. A conclusão do longa permeia a utilização da máquina e questões éticas e morais, deixando para o espectador um bom campo para  reflexão. É um longa que deixa as conclusões por conta do espectador, sendo então entendido de maneiras diferente pelos espectadores. Não é um filme fácil e tão pouco prazeroso. A questão fica assim: Se você se acha sabidão, metido a inteligente, aceite o desafio proposto por Primer, assista-o.

O mais curioso do longa é que, Primer enquanto obra ou invenção, também foi produzido na garagem onde foi filmado. Shane Carruth não sabia o que ia sair dali. E o filme e a máquina são a mesma coisa. Seria isso algo do futuro do cinema? Cinema nascendo nas garagens ou porões, bem longe dos holofotes de Hollywood? A única certeza é que, para um filme feito em uma garagem, Primer é tecnicamente é impecável.



PRIMER (2004)
Direção: Shane Carruth

Gilvan Marçal - gilvan@gmail.com 
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