Lost - 1ª Temporada
“O vôo 835 da Oceanic AirLines que partiu de Sidney, Austrália, com destino a Los Angeles perdeu contato com a torre de comando há algumas horas. Autoridades australianas após inúmeras tentativas de contatar o avião acreditam que ele tenha caído no mar.” Essa seria a chamada jornalística para o ponto inicial da série televisiva mais comentada da atualidade - LOST.
O sucesso de LOST desembarcou de vez no Brasil após a exibição da série pela Globo. O canal a cabo AXN já exibia anteriormente a série, com grande sucesso, mas a ainda modesta difusão a cabo no Brasil não propiciou uma maior visibilidade. A tv paga ainda não é economicamente viável a grande parcela da sociedade. Exibida em um péssimo horário, após o Jornal da Globo, LOST apresentou bons índices de audiência, em especial no episódio inicial, vinculado no domingo. O fenômeno que tomou os EUA, exibido pela ABC, ganha a visibilidade apropriada na TV brasileira.
Durante um vôo de Sidney, Austrália, para Los Angeles, o avião cai numa ilha. Em meio aos destroços, os sobreviventes tentam se reunir e aguardar o resgate. Porém, a ilha, que se acredita estar deserta, esconde inúmeros mistérios. O episódio piloto, composto de dois episódios de cerca de 40 minutos, é um estrondoso cartão de visitas do que é a série. Entre o caos da queda, pessoas feridas e mortas e as discussões entre os sobreviventes, algo na floresta demonstra não gostar da presença dos estranhos na ilha. Os dois episódios podem ser vistos como um longa-metragem tenso, intrigante e extremamente bem realizado.
Daí a importância do CineSequencia falar sobre LOST. Grande parte dos elementos da série, sobretudo os mais relevantes, são utilizados com base no cinema. As filmagens são realizadas em uma locação, na ilha Oahu, no Havaí. Essa escolha permite que as cenas sejam mais realistas, o que muito contribui para a construção fotográfica. Com a natureza abundante da ilha, a câmera não se restringe aos close-ups cansativos que imperam na linguagem televisiva. Utilizam-se planos abertos, panorâmicas, pequenos planos seqüências, toda uma estrutura que é característica do cinema. Isso torna a série visualmente estranha aos olhos do habitual espectador de TV. Há algo novo ali.
O roteiro de LOST utiliza uma estrutura narrativa bem mais complexa que a usual na televisão. Entre os sobreviventes, cerca de 50, 14 personagens possuem caráter ativo no enredo. Não se vê muito na TV - séries, contos e estórias - que possuam tantos personagens ativos. A exceção seria as novelas, que possuem um número expressivo de personagens. Entretanto, não creio que alguma possua 14 personagens principais. Tamanha complexidade tende a afastar o espectador “preguiçoso” de Tv, que deseja apenas um entretenimento fácil. No cinema, pode-se ver algumas incursões desse tipo, mas são raros os diretores que possuem coragem e talento para tal, como em Magnólia, Crash – No Limite e Short Cuts – Cenas da Vida. Cada personagem de LOST possui sua própria narrativa que acompanham uma narrativa maior, a convivência e os mistérios da ilha.
Durante os 25 episódios da primeira temporada, conhecemos a estória de cada personagem. O que fazia antes de cair na ilha, qual seu passado e o que estava fazendo na Austrália até pegar o vôo. Essas peças do passado são inseridas através de flashbacks, que são primordiais para entender quem é aquela pessoa e compreender suas atitudes na ilha. Os flashbacks possibilitam o espectador montar um quebra-cabeça fascinante sobre cada personagem. Montar cada quebra-cabeça é essencial para tampar as lacunas do quebra-cabeça principal - os mistérios da ilha.
O grande mérito de LOST está nos personagens. São completamente verdadeiros e conseguem a simpatia ou antipatia do espectador. A cada episódio um personagem, ou grupo deles, torna-se foco da narrativa. Um exemplo: Locke. Até o embarque no avião ele era um deficiente físico que perdeu o movimento das pernas. Após a queda, Locke percebe que consegue andar novamente. Enquanto conhecemos a personagem, vamos também agregando informações sobre os mistérios da ilha. Locke percebe que há algo especial naquela ilha que possibilitou ele andar. Agora, o que possibilitou isso, ninguém sabe ainda. Portanto, continue a assistir LOST.
Esse clima de mistério, que agrada muito os espectadores, se assemelha a outra série de sucesso, Arquivo X. O criador de LOST, J.J. Abrams, inteligentemente, conseguiu agradar e “laçar” todos os órfãos de Scully e Mulder. Mas, engana-se quem achar que os mistérios são o único atrativo. O relacionamento humano entre os sobreviventes é o pilar do sucesso da série. Entre os 14 personagens temos um iraquiano, Sayid, que é logo acusado de terrorismo pela queda do avião. Charlie, um ex-rock star viciado em heroína. Jack, um médico que apesar de bem-sucedido, possui problemas afetivos e com o pai. A série discute vários assuntos pertinentes à sociedade americana através das relações pessoais entre as personagens. Bem roteirizado, LOST ainda tem a ousadia de obrigar os espectadores americanos a lerem legendas, algo que odeiam, através dos diálogos de um casal coreano. Mesmo que não falando a mesma língua podemos nos entender, basta boa vontade. Os criadores e roteiristas fazem de LOST, além de um grande entretenimento, uma possibilidade de reflexão, o que é muito salutar para o momento mundial. Destaco o episódio em que Charlie luta contra a dependência química. Mesmo confinado numa ilha, onde possivelmente não haverá mais drogas, o dependente químico precisa apenas de uma coisa para vencer o vício - vontade própria.
Através dos mistérios da ilha, LOST consegue resgatar uma sensação que a série Arquivo X implantou em seus espectadores: o To Be Continued (Continua...). Imerso na trama, o espectador é obrigado a esperar mais uma semana para ver a conclusão da trama do episódio a que estava assistindo. Uma expectativa angustiante que é explorada com um esplendor memorável nos últimos três episódios da primeira temporada. Quando finalmente vamos saber algo sobre o foco daquela narrativa, a escotilha, o episódio termina. Agora, só na segunda temporada. Não há como resistir, o espectador já está viciado em LOST.
Quem perdeu a exibição pela Globo não precisa lamentar, pois foi lançado no dia 8 de março a caixa dos DVDs da primeira temporada. A caixa possui sete DVDs contendo os episódios, making offs e entrevistas com os atores e realizadores. Fica a expectativa para a segunda temporada, que já começou a ser exibida pela AXN. Resta saber quando a Globo vai exibi-la.
Os cinéfilos devem assistir LOST, pois a série parece ser o começo do fatídico encontro entre a tv e o cinema. Essa fusão de linguagem cinematográfica, periodicidade televisiva, internet, tv digital, HDTV e downloads de episódios pode estar apontando para o futuro do entretenimento audiovisual. Vamos ficar de olho.
Lost - 1ª Temporada (2004)
Direção: Vários
Elenco: Naveen Andrews, Emilie de Ravin, Matthew Fox, Jorge Garcia, Maggie Grace, Josh Holloway, Malcolm David Kelley, Daniel Dae Kim, Yoon-jin Kim, Evangeline Lilly, Dominic Monaghan, Terry O'Quinn, Harold Perrineau.
Gilvan Marçal - gilvan@gmail.com
O sucesso de LOST desembarcou de vez no Brasil após a exibição da série pela Globo. O canal a cabo AXN já exibia anteriormente a série, com grande sucesso, mas a ainda modesta difusão a cabo no Brasil não propiciou uma maior visibilidade. A tv paga ainda não é economicamente viável a grande parcela da sociedade. Exibida em um péssimo horário, após o Jornal da Globo, LOST apresentou bons índices de audiência, em especial no episódio inicial, vinculado no domingo. O fenômeno que tomou os EUA, exibido pela ABC, ganha a visibilidade apropriada na TV brasileira.
Durante um vôo de Sidney, Austrália, para Los Angeles, o avião cai numa ilha. Em meio aos destroços, os sobreviventes tentam se reunir e aguardar o resgate. Porém, a ilha, que se acredita estar deserta, esconde inúmeros mistérios. O episódio piloto, composto de dois episódios de cerca de 40 minutos, é um estrondoso cartão de visitas do que é a série. Entre o caos da queda, pessoas feridas e mortas e as discussões entre os sobreviventes, algo na floresta demonstra não gostar da presença dos estranhos na ilha. Os dois episódios podem ser vistos como um longa-metragem tenso, intrigante e extremamente bem realizado.
Daí a importância do CineSequencia falar sobre LOST. Grande parte dos elementos da série, sobretudo os mais relevantes, são utilizados com base no cinema. As filmagens são realizadas em uma locação, na ilha Oahu, no Havaí. Essa escolha permite que as cenas sejam mais realistas, o que muito contribui para a construção fotográfica. Com a natureza abundante da ilha, a câmera não se restringe aos close-ups cansativos que imperam na linguagem televisiva. Utilizam-se planos abertos, panorâmicas, pequenos planos seqüências, toda uma estrutura que é característica do cinema. Isso torna a série visualmente estranha aos olhos do habitual espectador de TV. Há algo novo ali.
O roteiro de LOST utiliza uma estrutura narrativa bem mais complexa que a usual na televisão. Entre os sobreviventes, cerca de 50, 14 personagens possuem caráter ativo no enredo. Não se vê muito na TV - séries, contos e estórias - que possuam tantos personagens ativos. A exceção seria as novelas, que possuem um número expressivo de personagens. Entretanto, não creio que alguma possua 14 personagens principais. Tamanha complexidade tende a afastar o espectador “preguiçoso” de Tv, que deseja apenas um entretenimento fácil. No cinema, pode-se ver algumas incursões desse tipo, mas são raros os diretores que possuem coragem e talento para tal, como em Magnólia, Crash – No Limite e Short Cuts – Cenas da Vida. Cada personagem de LOST possui sua própria narrativa que acompanham uma narrativa maior, a convivência e os mistérios da ilha.
Durante os 25 episódios da primeira temporada, conhecemos a estória de cada personagem. O que fazia antes de cair na ilha, qual seu passado e o que estava fazendo na Austrália até pegar o vôo. Essas peças do passado são inseridas através de flashbacks, que são primordiais para entender quem é aquela pessoa e compreender suas atitudes na ilha. Os flashbacks possibilitam o espectador montar um quebra-cabeça fascinante sobre cada personagem. Montar cada quebra-cabeça é essencial para tampar as lacunas do quebra-cabeça principal - os mistérios da ilha.
O grande mérito de LOST está nos personagens. São completamente verdadeiros e conseguem a simpatia ou antipatia do espectador. A cada episódio um personagem, ou grupo deles, torna-se foco da narrativa. Um exemplo: Locke. Até o embarque no avião ele era um deficiente físico que perdeu o movimento das pernas. Após a queda, Locke percebe que consegue andar novamente. Enquanto conhecemos a personagem, vamos também agregando informações sobre os mistérios da ilha. Locke percebe que há algo especial naquela ilha que possibilitou ele andar. Agora, o que possibilitou isso, ninguém sabe ainda. Portanto, continue a assistir LOST.
Esse clima de mistério, que agrada muito os espectadores, se assemelha a outra série de sucesso, Arquivo X. O criador de LOST, J.J. Abrams, inteligentemente, conseguiu agradar e “laçar” todos os órfãos de Scully e Mulder. Mas, engana-se quem achar que os mistérios são o único atrativo. O relacionamento humano entre os sobreviventes é o pilar do sucesso da série. Entre os 14 personagens temos um iraquiano, Sayid, que é logo acusado de terrorismo pela queda do avião. Charlie, um ex-rock star viciado em heroína. Jack, um médico que apesar de bem-sucedido, possui problemas afetivos e com o pai. A série discute vários assuntos pertinentes à sociedade americana através das relações pessoais entre as personagens. Bem roteirizado, LOST ainda tem a ousadia de obrigar os espectadores americanos a lerem legendas, algo que odeiam, através dos diálogos de um casal coreano. Mesmo que não falando a mesma língua podemos nos entender, basta boa vontade. Os criadores e roteiristas fazem de LOST, além de um grande entretenimento, uma possibilidade de reflexão, o que é muito salutar para o momento mundial. Destaco o episódio em que Charlie luta contra a dependência química. Mesmo confinado numa ilha, onde possivelmente não haverá mais drogas, o dependente químico precisa apenas de uma coisa para vencer o vício - vontade própria.
Através dos mistérios da ilha, LOST consegue resgatar uma sensação que a série Arquivo X implantou em seus espectadores: o To Be Continued (Continua...). Imerso na trama, o espectador é obrigado a esperar mais uma semana para ver a conclusão da trama do episódio a que estava assistindo. Uma expectativa angustiante que é explorada com um esplendor memorável nos últimos três episódios da primeira temporada. Quando finalmente vamos saber algo sobre o foco daquela narrativa, a escotilha, o episódio termina. Agora, só na segunda temporada. Não há como resistir, o espectador já está viciado em LOST.
Quem perdeu a exibição pela Globo não precisa lamentar, pois foi lançado no dia 8 de março a caixa dos DVDs da primeira temporada. A caixa possui sete DVDs contendo os episódios, making offs e entrevistas com os atores e realizadores. Fica a expectativa para a segunda temporada, que já começou a ser exibida pela AXN. Resta saber quando a Globo vai exibi-la.
Os cinéfilos devem assistir LOST, pois a série parece ser o começo do fatídico encontro entre a tv e o cinema. Essa fusão de linguagem cinematográfica, periodicidade televisiva, internet, tv digital, HDTV e downloads de episódios pode estar apontando para o futuro do entretenimento audiovisual. Vamos ficar de olho.
Segunda Temporada - Câmbio Negro
Os espectadores que não conseguirem esperar para saber o que tem dentro da escotilha podem recorrer à internet para baixar os 16 primeiros episódios da segunda temporada. Quem não quiser ter o trabalho de baixar, pelo Mercado Livre já é possível comprar DVDs. Já digo a você: o que tem dentro da escotilha é muito interessante, mas isso fica para o próximo artigo, quando acabar a segunda temporada.
Lost - 1ª Temporada (2004)
Direção: Vários
Elenco: Naveen Andrews, Emilie de Ravin, Matthew Fox, Jorge Garcia, Maggie Grace, Josh Holloway, Malcolm David Kelley, Daniel Dae Kim, Yoon-jin Kim, Evangeline Lilly, Dominic Monaghan, Terry O'Quinn, Harold Perrineau.
Gilvan Marçal - gilvan@gmail.com
Desde o "Arquivo X" que não tinha algo tão instigante. Muito bom mesmo.
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