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Ela

Querido Spike Jonze,

Sou um grande apreciador do seu trabalho desde os tempos em que dirigia videoclipes de bandas como REM, Beastie Boys, Bjork e The Chemical Brothers. Com grande surpresa vi sua estréia no cinema em parceria com outro maluco, Charlie Kaufman, em Quero Ser John Malkovich. Vi todos os seus filmes. Adorei Adaptação e devo ser um dos poucos que chorou copiosamente com o final de Onde Vivem os Monstros. Mas essa minha carta não é para ficar lhe bajulando, mas para lhe dizer que, as vezes, eu também me sinto só. Sentia-me mais antigamente, e me agarrava aos filmes, seja por entretenimento ou para me conhecer melhor.

Essa semana vi Ela, seu mais novo filhote cinematográfico. Que coisa linda, você deve ter ficado orgulhoso do resultado. Fique, pois eu fiquei. Acho tão bacana um diretor novo e diferente (leia-se estranho) se dando bem na controversa Hollywood. É, também fica fácil fazer esse filmaço com a ajuda do sensacional Joaquin Phoenix (O Mestre), que gostaria também de congratular. Mande um abraço para ele.

Sabe, Ela consegue acessar parte soturnas da nossa mente e alma. Coisas que queremos deixar escondidas, como aquela leve atração por sexo na internet. Queremos sim nos relacionar, transar, mas o mundo anda tão perigoso. Já é difícil ficar nu para outra pessoa, imagine então abrir o coração? Muitas vezes acabamos nos escondendo atrás do véu digital do mundo virtual. Local em que não sou tão feio, tão gorda, tão desajeitado, tão tímida, onde meu pênis pode ter mais de 25 centímetros e a pessoa do outro lado finge acreditar. Criamos mentiras e máscaras para viver melhor. Ou como bem mostra seu filme, para mentir para nós mesmos que estamos bem.

Eu creio que você acertou em explorar o lado mais sombrio do ser humano, a solidão, utilizando como artifício o computador. Claro que tu é malandro, pois fica fácil se apaixonar pela Scarlett Johansson, que por sinal ficou muito bem. Inevitável a piada, pois a melhor atuação da carreira da garota é justamente quando ela não aparece na tela. Que maldade. [risadas] Gostei muito da dinâmica do casal e a instigante cena em que ela some, que só é superada pela que ele questiona por quantos outros ela está apaixonada também. Lindo, sensível, engraçado e ousado. Todos esses adjetivos são para dizer meu amigo, Jonze, que após quatro longas, você ganhou um fã e, prometo, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, no cinema ou na TV, te acompanhar até essa comunhão acabar.

Não sou um daqueles críticos renomados e inteligentes, como o saudoso Roger Ebert, que assim como eu ia louvar Ela. Só queria deixar registrado o quanto essa sua obra é pungente e importante para quem aprecia cinema. A conclusão do longa com a participação de Amy Adams (Trapaça) é de uma beleza estratosférica. Apesar de desejarmos uma vida programada e com uma tranquilidade matemática que só pode ser calculada por computadores, a vida, o amor, as relações pessoais serão sempre frutos de uma equação inexata. A máquina foi programada para não errar e quando isso acontece ela não sabe como sair desse dilema, afinal, ninguém a programou para isso. Nós precisamos do erro, do dilema, do atropelo. É assim que, diariamente, vamos reprogramando, replanejando, reaprendendo o que é a vida. Obrigado Spike, seu filme Ela conseguiu dizer isso de uma maneira muito surpreendente.

Abraços do amigo e fã,

Gilvan Marçal

Ps.: Onde se meteu o Charlie [Kaufman] que anda tão sumido? Temos que marcar uma cerveja um dia desses.



Ela (Her - 2013)
Direção: Spike Jonze
http://www.imdb.com/title/tt1798709/

Gilvan Marçal - gilvan@gmail.com
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