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Vinícius

Delicioso e inspirador, o filme de Miguel Faria Jr. é um deleite para o espectador, e não só para os fãs de Vinícius de Moraes. A riqueza da personalidade do poeta supera, em muito, inúmeros personagens de ficção, até mesmo os construídos de forma complexa e nuançada. E o melhor é saber que ele realmente existiu. Não só existiu, como sempre esteve presente na vida de praticamente todo brasileiro. Não há quem não conheça “Garota de Ipanema” – uma das músicas mais tocadas no mundo - ou “Eu sei que vou te amar”. Todo mundo sabe quem foi Vinícius de Moraes, mas o documentário nos apresenta outra dimensão dessa figura famosa. E nada melhor para conhecê-lo a fundo do que ouvindo, de seus amigos e familiares, a vida ao lado dele, os casos, as histórias por trás das músicas e tudo o mais que têm a dizer – e que não é pouco.

Vinícius conseguia misturar suas influências clássicas com as populares, transformando-as com seu imenso potencial criativo. Tanto sua vida pessoal quanto seu trabalho eram um misto dessas duas vertentes resultando em algo novo e revolucionário. Era, ao mesmo tempo, diplomata e boêmio. Escrevia de acordo com a métrica tradicional, mas seus poemas falavam do cotidiano. Vinícius era um sujeito fantástico e o filme exala seu amor pela vida, seu jeito passional, suas peculiaridades, suas emoções. No discurso de seus próximos, transbordam a afeição e a admiração que tinham por ele. Até mesmo Chico Buarque, comumente tão contido, se desmancha em riso, o que é delicioso de se assistir. Todos os entrevistados têm um brilho no olhar e um entusiasmo contagiante. Mesmo quando falam de seus pontos fracos, o carinho está presente. É impossível não se envolver e não se apaixonar por Vinícius.

No documentário, além do já mencionado Chico, há depoimentos de Ferreira Gullar, Carlos Lyra, Caetano Veloso, Maria Bethânia, Toquinho, entre outros companheiros e familiares. Há inúmeras histórias memoráveis e pérolas de toda uma vida fascinante. Várias das frases de Vinícius, sejam versos de poemas, letras de músicas ou observações em botecos são marcantes e denotam tanto sua sabedoria quanto o invejável manejo da linguagem. Suas palavras ecoam em nossas cabeças, mesmo após o término da projeção. O humor é constante e são diversos os momentos hilários.

Vinícius, por estar longe de ser uma pessoa perfeita, torna-se interessante e encantador. Pode até ser que tenha sido um alcoólatra, inconseqüente e maníaco-depressivo – e algumas falas dão esses indícios – mas isso é o de menos. Percebemos que deve ter sido difícil uma convivência próxima e que seus familiares devem ter sofrido maus bocados, mas nada disso tira a beleza de sua existência. Talvez justamente seus grandes defeitos tenham permitido que tivesse grandes qualidades. Ou talvez as grandes qualidades venham, necessariamente, acopladas de grandes defeitos. O documentário nos faz questionar se vale a pena ser como ele e viver intensamente, já que seu modo de vida, naturalmente, tinha conseqüências. São questões a se pensar. E fazer pensar é uma conquista maravilhosa para um filme.

O mérito de Vinícius não está por completo na figura da pessoa que o nomeia. A montagem é brilhante, relacionando músicas a momentos de vida, intercalando com imagens de arquivo. A própria edição é fonte de diversão quando coloca, seguidamente, determinada pessoa descrevendo a relação do poeta com o álcool e uma imagem de Vinícius cantando, completamente bêbado, abraçado a Tom Jobim. Os depoimentos são bem colhidos e os entrevistados parecem estar completamente à vontade. O filme obtém sucesso ao estabelecer uma atmosfera boêmia e tipicamente brasileira, fazendo uso de trechos em que o músico canta em uma roda de amigos ou de paisagens do Rio de Janeiro - a praia, o calçadão, as ruas. Os shows de alguns intérpretes cantando Vinícius são uma boa escolha, tendo em vista que as músicas, tão belas e emocionantes, não poderiam faltar em um filme que falasse dele. Já Ricardo Blat e, principalmente, Camila Morgado soam um tanto artificiais e exageram na teatralidade, apesar de alguns momentos de boa interpretação. A postura dos atores parece não ser compatível com a figura despachada de Vinícius, seus valores e seu trabalho, de raízes tão populares.

Apenas a iniciativa de construir um filme para que o público brasileiro conheça profundamente um de seus mais interessantes ícones já merece aplausos. Mas além disso, o filme é realmente fabuloso e bem construído. Vinícius se inspirava por suas musas e não poucas paixões e, agora, é a vez do público se inspirar por ele. Trata-se de um filme com potencial para mudar sua vida. São muitos os que saem da sala de cinema querendo ser “um pouquinho mais Vinícius”.

Vinícius (2005)
Direção: Miguel Faria Jr.
Elenco: Ricardo Blat, Camila Morgado.

Mariana Souto - souto_mariana@yahoo.com.br

6 comentários:

  1. É Mariana, eu saí do cinema (em todas as 3 vezes que assisti) com vontade de ser "um pouquinho mais Vinicius".
    Concordo com TUDO o que vc falou. Esse é aquele filme que se mantém em nossas mentes por semanas após tê-lo assistido. Será que ele foi feliz? Como disse em um de seus poemas: "prefiro viver do que ser feliz..."
    Eu também.
    Parabéns pela ótima crítica, estou a cada dia mais fã do blog!
    Beijos!

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  2. A questão "será que ele foi feliz?" é uma das que mais faz pensar em "Vinícius". Fico me perguntando se viver intensamente e ser feliz são coisas incompatíveis. Espero que não!

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  3. Ah, Vinicius! Também concordo com tudo o que vc falou, Mari! Achei a Camila Morgado um tanto quanto forçada, bem menos que o Ricardo Blat. E acho que algumas músicas poderiam ter sido interpretadas por outras pessoas, mas de qualquer forma eu achei interessante a escolha das músicas e dos intépretes.
    E eu bem sei como esse filme pode mexer com alguém... :)
    Alias, está na hora de vê-lo outra vez... Que tal?

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  4. Pensei em outra coisa: imagina que divertido se tivesse depoimentos das ex-esposas do Vinícius... Seria interessante ver o que elas falariam sobre ele!

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  5. Sim, pensei nisso! Não houve depoimentos de ex-mulheres e imagino como seriam, já que a vida de quem era muito próximo de Vinícius era bastante conturbada.
    Abraços :)

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